Mentalidade Revolucionária: Um Conceito Inútil
Um dos conceitos olavianos mais típicos é o da "mentalidade revolucionária", que Olavo de Carvalho define como "o estado de espírito, permanente ou transitório, no qual um indivíduo ou grupo se crê habilitado a remoldar o conjunto da sociedade [...] por meio da ação política; e acredita que, como agente ou portador de um futuro melhor, está acima de todo julgamento pela humanidade presente ou passada, só tendo satisfações a prestar ao 'tribunal da História'."
Segundo Olavo, tal "mentalidade" seria a grande responsável pela maioria dos genocídios dos últimos séculos, e seria, ademais, dada à construção de formas totalitárias de governo. Independentemente de seu conteúdo ideológico, essa própria mentalidade em si, ao visar remodelar a ordem política e a vida humana, seria nefasta e tirânica.
Com base nesse conceito, Olavo dizia existir algo como um "movimento revolucionário", o qual seria o motor das "revoluções", lidas como algo genérico e indistinto, com finalidades necessariamente expansionistas e universalistas.
De imediato, o conceito se mostra pueril e inútil.
Em primeiro lugar, uma "revolução" é tão somente um "retorno". O vocábulo nasce na astronomia para designar o movimento de rotação e passa a ter uma significação mais ampla de "mudança recorrente" ou de "transformação súbita" no século XV.
Em segundo lugar, a descrição dada sobre a suposta "mentalidade revolucionária" é inútil porque serve basicamente para designar toda posição política iliberal sustentada no planeta desde Platão - filósofo que, como se sabe, almejava (entre outras coisas) precisamente "remoldar o conjunto da sociedade". De Platão em diante, boa parte dos principais filósofos que se dispuseram a escrever sobre política padeciam, por essa definição, de uma "mentalidade revolucionária". Só não tentaram implementar a sua "revolução" aqueles que não tinham ao alcance os meios para isso, mas todos eles expressaram seu desejo por reformar o homem e remodelar a sociedade.
Temos, então, como "revolucionários genocidas" diante de nós não apenas Platão, Aristóteles e Juliano, ou bem antes deles, já Licurgo, mas também uma série de autores medievais, São Thomas More, Tommaso Campanella, os jesuítas e suas missões no sul do Brasil, a Doutrina Social da Igreja, e assim por diante. Necessário, demais, apontar que nessa "mentalidade" deveriam ser, também, enquadrados personagens como os "Founding Fathers" dos EUA e Oliver Cromwell, figuras categoricamente milenaristas, imbuídas de delírios messiânicos e utopistas que visavam não apenas remodelar suas sociedades, mas também manipular a natureza humana. Mas imagino que Olavo de Carvalho preferia ignorar isso.
Chama a atenção, ademais, o fato de que a descrição dada por Olavo não se aplica a boa parte das revoluções ocorridas ao longo da história, desde a Antiguidade e do Medievo (onde, sim, houve revoluções e revolucionários). Tomemos, por exemplo, a Revolução Iraniana que visava, objetivamente, uma remodelação total da ordem social, mas não resultou em qualquer totalitarismo ou em qualquer genocídio, tampouco possui pretensões universalistas.
O que fica bastante claro, porém, é que de modo geral só não está acometido pela "mentalidade revolucionária" quem é liberal e vive em uma sociedade liberal. Nesse sentido, o conceito olaviano parece um plágio adaptado da distinção "sociedade aberta x sociedade fechada" de Karl Popper. Haveria um vínculo claro entre a "mentalidade revolucionária" e a emergência de "sociedades fechadas" como sua consequência.
E toda a descrição dessa mentalidade, bem como aquilo que é oferecido em contraposição a essa mentalidade, não vai além do liberalismo. Para não ser um "revolucionário", portanto, basta ser um conformista ou alguém que crê que a função da política é apenas preservar uns quantos "direitos naturais" e discutir miudezas quotidianas.